quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Síndrome do Comportamento e Relacionamento Conjugal


Na rotina do relacionamento eles emergem, incluindo a dificuldade de manter o vínculo afetivo, causando a Síndrome do Comportamento de Hospedagem. Ela vai distanciando o casal através de comportamentos independentes ao extremo. A pessoa exerce os papéis cotidianos normalmente, todavia, demonstra frieza e comporta-se como um hóspede dentro de casa. Neste caso, especificamente, a precariedade vincular é a causadora deste comportamento, visto ser difícil para o seu portador manter um contato afetivo que ele próprio não pode oferecer.

A tendência da síndrome é gerar um conflito pessoal e, conseqüentemente, no casal, que pode acabar se separando. A conversa conjugal é capaz de abrir a primeira porta para a identificação desta síndrome, bem como buscar ajuda especializada, objetivando a melhora pessoal e uma vida conjugal qualitativa com psicoterapia.

Ao observar os conceitos sobre o vínculo afetivo, bem como as suas implicações no ser humano, é possível prospectar formas favoráveis e desfavoráveis de relacionamento ao longo da vida. Se a formação da personalidade de uma pessoa contar com a existência de um vínculo precário, torna-se incompatível a existência de um relacionamento conjugal. Em relatos clínicos obtêm-se históricos onde o marido ou a esposa não tiveram essa formação vincular com os seus pais. Posteriormente, na vida a dois, encontram dificuldades em manter o relacionamento por falta desta condição vincular.

Muitos obstáculos nas relações humanas estão ligados a esta precariedade de vínculo. O casal não consegue perceber este tipo de deficiência em seu relacionamento. Focaliza os problemas em outras questões, ou ainda, prefere nem tocar no assunto. Há casos em que ignora a possibilidade de lançar mão de uma psicoterapia. E, existem situações em que a resistência impera. Fato comum é dizer que não se precisa de tratamento algum, pois que as dificuldades são de outra ordem. Todavia, perde-se a chance de resolver na causa os efeitos de uma convivência difícil.

Nestes casos, especificamente, onde houve uma deficiência na formação de vínculo e as decorrências comprometem os relacionamentos subseqüentes, denominar-se-á Síndrome do Comportamento de Hospedagem ou SCH.

No relacionamento de um casal onde há a presença da SCH, quando entra na rotina da convivência, faz surgir um novo tipo de comportamento. Ele é extremamente prejudicial. A pessoa age, inconscientemente, de forma semelhante a um hóspede dentro de sua casa. Realiza as suas atividades comuns. Mantém a comunicação e os hábitos rotineiros, inclusive os financeiros.

No entanto, a sua forma de ser e estar apresentam um novo item: a frieza ocasionada pelo distanciamento. Aos poucos vai agindo como se fosse alguém que está hospedado na casa, cumprindo com alguns papéis pertinentes, todavia, trata as questões, antes parcimoniosas, de forma independente. Deixa as responsabilidades, sobretudo as domésticas, para o outro cuidar. Onde havia uma atmosfera de cordialidade e doçura, passa a existir um espectro de isolamento e pesar. O outro vai percebendo, sensivelmente, as diferenças no tratamento recebido e acaba por se sentir, pouco a pouco, só. A sensação deste isolamento origina-se na forma pela qual a ausência do vínculo se manifesta nesta relação.

As discussões passam a existir com uma freqüência crescente em virtude do mal-estar alojado e da falta de compreensão acerca da síndrome. Os conflitos podem surgir e avoluma-se no processo bola-de-neve. A pouca consciência a respeito da SCH provoca a discórdia entre o casal, atingindo quem estiver por perto nesta convivência, via de regra, os filhos. Lembranças e cobranças de como a vida conjugal era boa anteriormente são lançadas no calor das discussões. Isto faz aquecer ainda mais o desentendimento. Esta é uma situação estressante para o casal, podendo levar os seus envolvidos à depressão e outros males. E, carrega a possibilidade de desencadear a separação. São duas polaridades se confrontando. De um lado, a ausência de vínculo, a vida isolada. De outro, a força presente da relação a dois. Os compromissos da união "pressionam" o contato mais íntimo da esfera afetiva. Caso ela não exista, torna-se um problema permanente.

Este comportamento de hospedagem reflete o quanto o seu portador, inconscientemente, procura manter distância afetiva do outro para que não haja envolvimento. Caso ocorra uma separação, desta forma, evitar-se-á o sofrimento de uma provável desvinculação. A despedida neste tipo de relacionamento demanda apenas a retirada de bagagens.

Por se tratar de uma síndrome enraizada na formação vincular faz-se necessária uma avaliação diagnóstica. Além de indicar tratamento através de profissional especializado nas relações familiares. Este especialista ocupa-se em compreender as relações conjugais e também a formação do vínculo como peça fundamental nas mudanças terapêuticas necessárias. Na descrição de Gaudêncio (2003), a terapia é o melhor atalho para o autoconhecimento, gerador de crescimento. Em uma das fases da terapia de casal, o cuidado está no vínculo, o qual permite uma continuidade na relação. Com os avanços possíveis os cônjuges podem estabelecer novo olhar sobre a relação, investindo energia na construção vincular.

O sofrimento causado pela Síndrome do Comportamento de Hospedagem modifica o foco energético dos investimentos psíquicos. Ou seja, ao invés das pessoas empregarem as energias e esforços no convívio, utilizam tais recursos na manutenção do isolamento. Soma-se a esta condição o desgaste ocasionado pelo conflito entre as polaridades (ausência vincular e a necessidade do elo afetivo), além dos resultados nefastos, colhidos após as discussões familiares. Há uma sensação de impotência e frustração perante os fatos, que ganham, cada vez mais, uma dimensão que sinaliza o triste fim da vida a dois.

Não raro, crê-se que a síndrome nasceu dentro do relacionamento. Todavia, ela, apenas, foi desencadeada durante o convívio. O seu portador não enxerga o problema já antigo, Brazelton (1988), Bee (1997), Bowlby (1990), Hoffman et al (1996), Winnicott (1993), Siqueira (2003), Adler (1937) e Maranata e Rezepka (1999). É possível comparar relações anteriores a atual e sentir que há algo semelhante nelas. Contudo, é insuficiente para entender e aceitar a síndrome e a sua demanda por tratamento. O jogo de culpa é apenas um instrumento para se defender, na tentativa de diminuir as péssimas sensações que ganham terreno no cotidiano. De nada adianta. Só aproxima o casal da separação.

Separar, por sua vez, traz de volta o estado de isolamento requerido pela síndrome. Porém, ao mesmo tempo, causa dor e sofrimento. O que se acreditou ser bom anteriormente enquanto manter uma gostosa e importante relação familiar transforma-se em um pesadelo aterrador com a ruim convivência e a separação.

Buscar ajuda especializada é o remédio para este mal. Crer numa solução de poucos recursos como o esperar o tempo como agente de mudanças é dar oportunidade para que se instale a piora da SCH. Uma boa avaliação psicológica pode dar novos rumos às vidas das pessoas que pretendem o convívio. Respeitando-se as individualidades e construindo relações afetivas, conforme Bowlby (1990), que sustentem os dissabores que a vida se encarrega de apresentar a todos, sem exceção.

Dialogar, e, entenda-se bem, conversar com o coração aberto, oferece uma primeira abertura para se compreender a vida do casal. Dar o primeiro passo pode modificar aquilo que já era considerado algo inevitável, como a separação. Empreender esta tarefa não é simples. Requer coragem e vontade para mudar. Aceitar os problemas e lutar para transformar o prejudicial em saudável. Há uma necessidade de crescimento por parte das pessoas envolvidas. O grau de maturidade determinará o quanto se quer conviver bem. Ambas as partes devem estar dispostas e comprometidas em participar deste processo, apoiando-se.

É preciso administrar os problemas existentes dando lugar ao desenvolvimento qualitativo de vida. Isto se dá de dentro para fora. Leva tempo, entretanto, deve-se considerar que os resultados, conforme a vontade empregada no processo, trarão maior liberdade para viver, individualmente e de forma conjunta. A Síndrome do Comportamento de Hospedagem nos prende a circunstâncias de isolamento, contrariando e causando dor diante dos nossos desejos de vida familiar. Cuidar da questão, alterando o comportamento de hospedagem para o de comprometimento afetivo em conjunto permite existir a unidade fundamental das relações conjugais: a dependência equilibrada e necessária do vínculo. Vale a pena lutar com vontade, ajuda e conhecimento.

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